A visão de produto, ou a declaração da visão de produto é uma ferramenta cada vez mais discutida e utilizada como instrumento de orientação para evolução de negócios. Especialmente no contexto de soluções digitais, as lideranças costumam sentir dificuldade de manter as múltiplas squads com uma visão clara do “destino final” de tudo aquilo que estão desenvolvendo.
Ela é quase como o “sonho” a ser alcançado e traz para dentro de uma frase (síntese) elementos importantes e esclarecedores que são fundamentais para manter times bem alinhados e, principalmente, caminhando rumo à direção esperada para que o negócio cresça e prospere.
Sem ela, dificuldades surgem e passam a ser frequentes no dia a dia dos times tech. Sua ausência traz colaterais que podem dificultar desde a definição de um roadmap até a atração e retenção de talentos.
Tendo sua importância e impactos em mente, decidimos escrever esse artigo, que terá como objetivo esclarecer algumas questões-chave sobre esse elemento estratégico:
- O que é uma declaração de visão de produto?
- Quais são os benefícios que ela traz para o negócio e seus times?
- Como definir uma boa visão de produto?
- Como mantê-la viva no dia a dia?
Vamos aos tópicos?
O que é a declaração de visão de produto?
A declaração da visão de produto é uma frase que descreve o alvo de longo prazo do seu produto ou solução. Não se trata de um marco mensurável, aliás esse é um erro comum: usar critérios de sucesso baseados em indicadores-chave como um “substituto” da visão de produto.
O primeiro passo importante é entender que a visão de produto não falará sobre números que você quer atingir, para isso você poderá utilizar outros instrumentos estratégicos que não abordaremos nesse artigo. Visões de produto são aspiracionais e comunicam de forma concisa onde o produto espera chegar e o que espera ser no longo prazo.
A declaração, ou frase que sintetiza a visão de produto, é um lembrete que serve para todos os stakeholders envolvidos no desenvolvimento e evolução do negócio (PMs, POs, time de desenvolvimento, executivos, Marketing, Vendas, CS etc). Para ilustrar, enquanto não chegamos no tópico que trata de sua definição, vamos a um exemplo bastante conhecido de mercado:
“To build a place where people can come to find and discover anything they might want to buy online.”
Esse exemplo da Amazon, que em português significa “construir um lugar onde as pessoas venham para encontrar e descobrir qualquer coisa que eles queiram comprar online” deixa claro e traz insights práticos sobre onde a empresa espera chegar do ponto de vista de produto.
Concorda que mesmo você não estando dentro da empresa e no dia a dia de desenvolvimento do produto, é possível ter clareza do caminho que eles esperam percorrer e onde querem chegar? Esse é o papel central da visão de produto.
Ainda usando a Amazon como exemplo para que você não cometa outro erro comum dentro desse assunto, perceba que eles não substituem a visão de produto pelo propósito corporativo ou visão corporativa (“Our vision is to be earth’s most customer-centric company”). Reforçando mais uma vez, a visão de produto resume onde você espera chegar, ou o que espera ser do ponto de vista de produto – propósito corporativo e visão corporativa falam do negócio como um todo.
Quais são os benefícios que ela traz para o negócio e seus times?
Agora que resumimos o conceito por trás da visão de produto, chegou o momento de falarmos sobre seus benefícios. Talvez aqui estejam os pontos de maior interesse para você e provavelmente o que te motivará a revisar ou iniciar o trabalho de definição da sua visão de produto. Se os benefícios descritos nos próximos parágrafos forem importantes para você, temos certeza de que irá avançar para o item 3 – que traz insights e dicas sobre sua definição.
Visão de produto ajuda a definir roadmaps melhores
A visão de produto permite uma abordagem “top-down” do processo de desenvolvimento e evolução de produtos. Com ela servindo de base para o “onde queremos chegar” fica muito mais fácil definir e priorizar os passos e entregas que nos colocam na direção do sonho.
Como mostramos em nossas redes em uma de nossas publicações recentes, a visão de produto deveria ser o primeiro passo dentro dos times que estão com o desafio de evoluir ou criar uma solução digital.
Melhora sua capacidade de tomar decisões estratégicas ao longo do processo de desenvolvimento
Quem nunca passou por reuniões em que a opinião pessoal de alguém acabou interferindo nas decisões de produto? Você e seu time estão lá, 100% focados nos clientes, com inúmeras pesquisas e dados para embasar suas escolhas e ainda assim ficam vulneráveis a opiniões externas que interferem frequentemente no caminho que estão percorrendo.
Se isso acontece com seu time, acredite, pode ser a falta de visão bem definida e alinhada que está permitindo que isso aconteça. Com a clareza de “onde se espera chegar” ou “o que espera se tornar” esse norteador passa a ser um dos principais, se não o principal critério para tomada de decisão estratégica dentro do time, mesmo quando envolve outros stakeholders. Por não estar relacionada com uma opinião individual – muito pelo contrário, é um alvo coletivo – é comum que a visão sirva como pergunta-chave para destravar decisões e impasses e, consequentemente, aprimorar sua capacidade de evoluir. Para saber se sua visão está bem definida e presente dentro do contexto de desenvolvimento do seu produto, tente se lembrar: qual foi a última vez em que você ou seu time tomaram uma decisão baseada na pergunta “o que está mais relacionado com nossa visão?” ou “qual das possibilidades nos coloca na direção que nossa visão pede?”.
Quando se tem uma visão bem definida e inspiradora, todos colaboram e querem que ela se torne uma realidade. Logo, todos caminham juntos na mesma direção.
Ajuda a manter os times e stakeholders alinhados
Talvez esse seja um dos principais benefícios. A declaração da visão de produto torna muito mais fácil articular o objetivo “mais alto nível” do seu produto ou solução. Seu CEO ou as lideranças de outras equipes interessadas no desenvolvimento do seu negócio saberiam responder o que seu produto espera ser no futuro? Ou em outras palavras, eles saberiam dizer para onde estão caminhando sem citar features?
Quando se tem visão clara, todos os públicos conseguem entender o caminho que estão percorrendo com muito mais facilidade. Até mesmo escolhas táticas passam a fazer muito mais sentido tanto para quem está dentro quanto para quem está fora do processo de desenvolvimento de produto.
Ian McAllister, Diretor de Produtos do Airbnb, traz uma opinião interessante sobre a importância de ter uma visão clara de produto no livro Product Roadmaps:
“Clearly explain why your product exists and your approach to running it. This could be a mission statement, tenets, or principles. The important thing is that you believe in them, and by pinning them at the top of every roadmap it will be clear if what follows in the roadmap doesn’t match your principles.”
Motiva e inspira
Assim como o Propósito Corporativo, a Visão de Produto tem um tom aspiracional. Por isso, ela pode motivar – de maneira mais tangível – todos aqueles envolvidos no processo.
Quando se trata de atrair novos talentos Tech, por exemplo, que aliás é um tema crítico para 9 em cada 10 empresas atualmente, geralmente não é a feature, desafio técnico ou remuneração que irá diferenciar sua oportunidade de outras opções que esse profissional já terá na mesa, mas sim esse objetivo maior, o sonho a ser perseguido.
Como definir uma boa visão de produto?
Agora que demos uma boa passada pelo conceito e também pelos benefícios da visão de produto podemos finalmente ir para sua definição. Para isso não precisaremos de tantas palavras, gostamos de frameworks e matrizes que facilitem o entendimento. Criamos um que você pode usar como base:
Obviamente o modelo é fictício, apenas para exemplificar como seria o uso desse frame para construção da declaração de visão do produto. Como é possível observar, a visão é composta por 4 elementos igualmente importantes:
Para: descreve o público, mercado ou persona-alvo. Pode ser super específico ou abrangente. No caso da Amazon citado anteriormente, eles usam “pessoas”.
Necessidade: descreve o desejo atendido ou a dor que o produto ataca. É aquilo que o produto se propõe a fazer do ponto de vista prático.
O que: descreve a categoria do produto. Em outras palavras, se alguém perguntasse o que é seu produto, o que você responderia? Há casos em que a resposta já é definida pelo próprio contexto de mercado em que seu produto está (categorias já existentes), já quando se trata de uma novidade de mercado, torna-se necessário um exercício de criação para definir sua categoria.
Diferenciação: com as definições de quem, o que e para que, chega o momento geralmente utilizado para trazer o futuro para o contexto da sua visão. É no tópico de diferenciação que costumamos tornar explícito “onde queremos chegar” ou “como queremos ser vistos/percebidos”.
Deixaremos aqui uma versão não preenchida caso queira utilizar futuramente em seus próprios casos. Vale ressaltar que esse não é o único ou o melhor processo de definição da visão, é apenas um dos que já testamos e podemos recomendar.
Caso esteja em um projeto ou negócio em que as coisas já estão acontecendo – já existe produto, roadmap etc – esse mesmo frame pode ser um bom ponto de partida de alinhamento. Convidar os principais stakeholders para responder a esses tópicos individualmente pode servir como exercício de alinhamento e até mesmo evidenciar a necessidade de iniciar um processo de definição da declaração de visão de produto.
Spoiler: rodar esse exercício costuma mostrar como as expectativas de futuro para um determinado produto não costumam estar alinhadas.
Como manter a visão de produto viva no dia a dia?
Ter a definição da visão não é o principal – desculpe dar essa notícia só agora. Na verdade, dentre os raros times com clareza de visão, mais raros ainda são aqueles que realmente encaram isso como um norteador. É bem comum que a definição empolgue no início, ganhe uma certa tração mas depois se torne mais uma frase bonita usada esporadicamente.
Para que isso não aconteça, fecharemos esse conteúdo com uma lista de dicas práticas:
- Compartilhe a visão do produto com a maior frequência possível. Seja repetitivo(a) se for o caso e não sinta vergonha disso. Traga ela sempre em rituais e cerimônias importantes para o time ou empresa.
- Provoque pessoas para que sejam guardiãs da visão junto com seu time. Chame outras lideranças e membros de outras equipes para avaliarem se os passos que estão dando estão conectados com a visão de produto. Isso automaticamente as fará lembrar de onde vocês esperam chegar.
- Sua visão é viva. Um dos sinais de que sua visão está presente de verdade no dia a dia do desenvolvimento de produtos é se ela passar a ser questionada. Será normal que sugestões de ajuste surjam e provocações também. Não tenha medo de fazer os ajustes que podem beneficiar o todo.
- Se possível, mantenha sua visão curta e inspiradora. Nesse sentido o exemplo fictício que desenhamos nem é tão bom exemplo assim. Procure as palavras certas, pense como as pessoas irão receber sua proposta, invista tempo na semântica e fuja de termos genéricos como “solução inovadora” e afins.
- Use sua visão como meio para provocar o foco nos usuários e não na tecnologia.
Esperamos que o conteúdo tenha trazido uma boa introdução ao tema e que, agora, você possa se aprofundar ainda mais na literatura ou com outras referências disponíveis. No melhor dos casos, esperamos que você se sinta encorajado(a) a dar esse passo de definição da visão de produto junto com seu time.
Sabemos o quanto isso pode ser benéfico 🙂
